Entre 4 e 16 de novembro de 2014, acontece na sede do movimento juvenil Habonim Dror, em São Paulo, a “Exposição Rabin – Paz é Compromisso”. O conceito dessa mostra vai além de trazer conhecimento sobre a vida do ex-primeiro-ministro israelense. Há um objetivo muito claro em todo o percurso dos textos, figuras, sons e vídeos: para concretizarmos nossos objetivos de vida, temos de estabelecer compromissos, e ainda que dificuldades apareçam no caminho, deveríamos manter-nos fielmente comprometidos. A visita à exposição é gratuita e fortemente recomendada para todos.
Nesse artigo, ressaltaremos quatro compromissos inesquecíveis que marcaram o último estadista israelense e como trazê-los para nossa vida.
A família de Rabin e o compromisso com a coletividade
O pai, Nehemiah, nasceu com o sobrenome Rubitzov, na Ucrânia. Emigrou para os EUA e, lá, filiou-se ao movimento socialista judaico Poale Zion (trabalhadores de Sião). Imbuído de sionismo, fez Aliá como voluntário da Legião Judaica, para, na 1a Guerra, lutar com os britânicos contra os otomanos. Na Palestina do Mandato Britânico, Nehemiah também foi ativo na Haganá (organização paramilitar de defesa do Yishuv e base do futuro Exército Israelense) e na Histadrut (união dos sindicatos de trabalhadores judeus).
Rosa Cohen, a mãe, nasceu na Bielorússia. Desde jovem, engajava-se social e politicamente em sua terra natal. O avô materno de Rabin era ortodoxo e antissionista, mas isso não impediu Rosa de participar da terceira Aliá para Israel e assentar-se num kibbutz no Lago Kineret. Mudou-se para Jerusalém, onde conheceu Nehemiah e deu à luz a Yitzhak. Era membra do Conselho Municipal de Tel Aviv, da Haganá, do Mapai (partido político que originou o atual Partido Trabalhista), além de trabalhar com educação.
O lar dos Rabin possuía compromisso permanente com voluntariado e participação na vida coletiva do Yishuv. Yitzhak absorveu esse compromisso de seus pais e levou-o a um patamar superior.
A bolsa de estudos em Berkeley e o compromisso com a defesa do Yishuv
Rabin passou seus dois últimos anos de estudante na Escola Agrícola Kadoorie, situada na baixa Galiléia, próxima do Monte Tabor. Ele escreveu, depois, que lá aprendeu valores morais necessários, como honra, confiança e verdade. Ao formar-se, em 1940, obteve uma bolsa de estudos para cursar Engenharia Hidráulica na Universidade da Califórnia em Berkeley. Ir estudar nos EUA era um antigo desejo, já que seu pai havia morado lá e lhe disse coisas muito boas sobre o país. Entretanto, a 2a Guerra havia começado e o medo de uma invasão nazista na região era grande. Para não abandonar seu compromisso com sua coletividade, seus amigos e sua terra, Rabin abdicou da bolsa e entrou na Palmach, o grupo de elite da Haganá.
Ele nunca obteve diploma universitário.
A conta corrente nos EUA e o compromisso com sua esposa e com a ética
Rabin foi embaixador de Israel nos EUA entre 1968 e 1973, quando retorna para sua terra. Em 1974, torna-se primeiro-ministro. Em 1977, o jornalista Dan Margalit, do periódico Haaretz, descobre que Rabin e sua esposa Léa mantinham duas contas-correntes ativas nos EUA, algo proibido pela lei israelense. No total, havia nelas 10 mil dólares depositados. Léa quis assumir a culpa, sozinha, por não tê-las fechado após retornarem de Washington para Jerusalém. Dada essa situação, Rabin não viu alternativa: deveria manter seu compromisso com a ética, com a honestidade e com sua esposa.
Por duas contas-correntes, por 10 mil dólares, ele renunciou à chefia do Estado de Israel e passou pela apuração do caso ao lado de Léa, como um cidadão comum.
A Primeira Intifada e o compromisso com o futuro do Estado de Israel
Entre 1987 e 1993, milhões de palestinos foram às ruas de Gaza e da Cisjordânia para mostrar sua insatisfação com suas péssimas condições de vida, como indivíduos e como nação. Usando paus, pedras e estilingues, atacaram as forças de segurança israelenses. Ao longo de toda a Primeira Intifada, Rabin foi o Ministro da Defesa. Junto com boa parte da sociedade israelense, ele teve dificuldade para compreender a insurgência popular palestina; ordenou que fosse reprimida com violência, não proibiu o uso de munição letal e, alegadamente, comandou que os ossos dos palestinos fossem quebrados. Rabin mantinha firme, segundo seus métodos, seu compromisso com a segurança do Estado de Israel.
No entanto, em 1988, quando o Rei Hussein da Jordânia abdicou da Cisjordânia em favor dos palestinos, Rabin percebeu que deveria mudar de estratégia. Na 1a Intifada, o povo palestino lutou por seus objetivos sem depender dos demais Estados árabes vizinhos (Líbano, Síria, Jordânia e Egito). Após décadas acreditando que possíveis acordos seriam negociados com esses Estados, e que os palestinos seriam mero detalhe no cenário, a nova realidade gritava à sua volta. Israel deveria negociar com as lideranças palestinas se quisesse manter-se um Estado democrático e judaico. O compromisso de Rabin com o futuro do Estado de Israel passava, obrigatoriamente, por mantê-lo seguro e por iniciar tratativas políticas sérias e concretas com os palestinos.
Dessa mudança de métodos, resultaram os Acordos de Oslo e a paz com a Jordânia.
Da oposição radical à paz com os palestinos, resultou o assassinato de Rabin e, talvez, seu projeto de sionismo.
Incitações, radicalismos, negações e o compromisso de cada um de nós com Israel
Nós, judeus da diáspora, fazemos doações a instituições judaicas, estudamos a História de Israel, denunciamos o antissemitismo quando o identificamos, celebramos feriados judaicos e fazemos Hasbará incondicional nas redes sociais. Estamos, indiscutivelmente, comprometidos com o Estado de Israel.
- 95% dos israelenses acreditam que há racismo no país. As vítimas são negros, palestinos cidadãos de Israel, ortodoxos e sefaradim. Devemos estar, incondicionalmente, comprometidos com isso? NÃO!
- O presidente de Israel, Reuven Rivlin, é alvo de campanhas de ódio e incitação à violência por parcela considerável da sociedade israelense, de forma terrivelmente similar a que Rabin sofreu. Nosso compromisso é, acima de qualquer crítica, com isso? NÃO!
- As leis de casamento em Israel são profundamente discriminatórias. Temos compromisso automático com isso? NÃO!
- 8% dos que se declaram judeus, em Israel, têm negados seus direitos a casarem-se, separarem-se e serem devidamente enterrados, devido ao excesso de poder conferido ao rabinato. Deve haver compromisso, sem reflexão, com isso? NÃO!
- O governo israelense, por meio de políticas e declarações radicais, isola-se assustadoramente do mundo, especialmente dos EUA. Podemos nos comprometer, sem senso crítico, com isso? NÃO!
Optei, propositalmente, por não entrar no tema do conflito. As paixões nele envolvidas são incomensuráveis. Esse artigo é para despertar em você, judeu sionista da diáspora, o desejo de sair da sua zona de conforto, questionar suas verdades inquestionáveis, sua fé cega nas “notícias” que lê no Facebook ou recebe por e-mail. Aqui no Brasil, se não tomamos a iniciativa, só ficamos sabendo dos ataques terroristas. Ou não-terroristas, como o atropelamento que deu a gritaria de sempre mas, como descobriu-se depois, foi um acidente de trânsito com omissão de socorro. O nosso compromisso com Israel é, sim, incondicional, no sentido que queremos que o país exista e o povo judeu tenha lá um lar.
No entanto, comprometer-se com racismo não é um compromisso sionista. Nem com ódio contra opiniões divergentes. Nem com discriminação religiosa. Nem com a existência de cidadãos de segunda classe, com menos direitos que os demais. Nem com a recusa infantil e automática de qualquer crítica, e a imediata desqualificação da crítica como antissemitismo. Isso não é sionismo. O compromisso não deve ser com isso, mas sim com um Estado de Israel democrático, judaico, inclusivo e que trate todos seus cidadãos e vizinhos de forma igualitária e humana. Informe-se, aprofunde-se, questione o que recebe e o que transmite. Promova uma mudança de métodos, como Rabin fez. Seu compromisso com Israel pode, hoje, ser um nó frouxo, que te fazem acreditar ser o único possível. Há outros jeitos mais sólidos, justos e humanos de amarrar-se com Israel.
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