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Fórum 18 exibe documentário Two Sided Story

Fórum 18 e B’nai B’rith Brasil convidam para a exibição do documentário “Two Sided Story”, seguido de debate.

Produzido pelo FAMILIES FORUM, pela produtora israelense 2SHOT e pela agência de notícias palestina MAAN, o documentário acompanha  o processo emocionante e raro vivido por israelenses e palestinos ao aprender a reconhecer a narrativa pessoal e nacional do outro.

O evento será realizado nesta segunda-feira, dia 21/07, às 20h, no prédio da B’nai B’rith (Rua Caçapava, 105. 4° andar. Jardins. São Paulo-SP).

É necessário confirmar presença pelo e-mail rafaela@forum18.com.br

Confira o trailer:

O Velho Continente afogado em velhas ideias

Diante da ascensão da extrema direita em países centrais como França e Inglaterra, do sentimento de eurofobia e de xenobia promovido por movimentos nacionalistas, e inclusive da vitória de pequenos partidos neonazistas, as eleições para o Parlamento Europeu parecem mostrar uma mudança que há muito se anunciava na política europeia.

Vivi na Europa durante dois períodos diferentes. Na realidade, vivi um ano na França, entre fevereiro de 2011 e fevereiro de 2012, enquanto fazia um intercâmbio pela USP, e estou novamente vivendo por aqui, fazendo um mestrado em Paris desde setembro de 2013. Certamente, as minhas impressões da vida no Velho Continente mudaram substancialmente desde a primeira vez que pisei aqui, há mais ou menos três anos e meio. Mudou a minha posição social: de estudante de graduação com uma bolsa da universidade e auxílio moradia do governo para um estudante de mestrado sem bolsa, trabalhando a noite em bares. Mas acredito que mudou também a percepção social e política de jovens europeus, nos últimos três anos, diante da ascensão da direita e da ausência de perspectivas futuras, que se resume na frase tantas vezes proferida: ”minha vida não será melhor do que a da geração de meus pais”.

Minha análise do resultado dessas eleições europeias se concentra sobretudo no caso da França, com algumas pitadas sobre os contrastes e semelhanças com a Itália, países em que vivi por mais tempo, e de onde a maior parte dos amigos com os quais travei relações são provenientes – em ambas vezes que por aqui estive.

Talvez a melhor frase que encontrei, capaz de condensar as tensões vivenciadas na França, hoje tenha sido pronunciada por um amigo francês, cuja família é originária de outros países e que trabalha em uma instituição financeira em Londres: ”Tem um ambiente de fim de império, decadência. E também eu sinto como se eu fosse parte de um mundo que não existe mais. Por minhas origens e pelos valores cosmopolitas que tenho. E pra mim, a França é um caso grave, mas podia se fazer uma observação mais geral de toda Europa”.

 

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Para aqueles que ainda acreditavam que nacionalismos e questões étnicas eram problemas ultrapassados, próprios ao século XX, esse último domingo 25 representou um verdadeiro tapa na cara: a Europa viu, atônita, a ascensão de partidos neofascistas como o UKIP britânico e o Front Nationale fancês. Partidos nacionalistas de direita também receberam muitos votos em quase todos os países, e os neonazistas Auba Dourada grega e o Jobbik húngaro obtiveram, respectivamente, dois e três deputados no Parlamento Europeu. Em suma, são 20% das cadeiras do Parlamento Europeu que encontram-se repartidas entre deputados de extrema-direita, prevalecendo entre eles uma tendência generalizada de eurofobia (daqueles que veem com reticência o projeto de unificação europeia) e, de modo nada contraditório, de xenofobia (daqueles que querem impor leis anti-imigração).

Na Itália, porém, um cenário muito diverso, em que o atual governo de transição, cuja maioria é do Partido Democrático, a centro-esquerda de Matteo Renzi (equivalente ao Partido Socialista francês, do presidente François Hollande), obteve também a grande maioria dos votos (41%), e o popular Beppe Grillo, que se diz para além da esquerda e da direita e propõe uma cruzada contra a corrupção em seu país, obteve 21%. Apesar de ser considerado como inclassificável no espectro político, disse a a senadores de seu partido que pretendiam suprimir o delito de ”imigração ilegal” : ”Quantos imigrantes podemos acolher se um italiano a cada oito não tem meios para comer?”, . A Itália também viu serem eleitos membros do partido separatista de extrema-direita Lega Nord, entre eles verdadeiras aberrações como Borghezio, famoso por declarações antissemitas e por ter afirmado que as forças armadas italianas deveriam atirar para afundar os navios de imigrantes que chegavam a sua costa.

Vale também mencionar que na Espanha e em Portugal, países muito castigados pela crise e cujo governo são formados por uma ampla maioria de direita, foram eleitos mais parlamentares de esquerda do que de direita.

”Unidos os franceses são invencíveis”/

Com este logo, o Front National, partido neofascista, chega à liderança da representação francesa no Parlamento Europeu. Que possíveis interpretações podem ser feitas de um partido que se elege com a grande maioria dos votos nacionais (com 25% do total de votantes) promovendo a saída da França da União Européia e da Zona Euro?

A resposta a essa pergunta, que talvez sirva de atalho para pensar o que acontece na França hoje, implica numa dupla análise: por um lado, as mudanças ocorridas dentro do próprio Front National. De outro, a desconfiança generalizada da população diante da possibilidade da centro-esquerda, representada no cenário político francês pela frágil figura do presidente François Hollande, propor uma solução factível ao problema da crise econômica.

Em primeiro lugar, Marine Le Pen não é Jean-Marie Le Pen. Filha e pai compartilham crenças nacionalistas, como a maior autonomia da França diante da União Européia, a restrição imigração, entre outros temas cuja solução proposta sempre vem de um ponto de vista conservador. Se Jean-Marie assustava os eleitores com um discurso radical, abertamente fascista e antissemita (foi condenado diversas vezes a pagar indenizações por suas declarações antissemita e chegou a afirmar,quando detinha um mandato de deputado no Parlamento Europeu, que as câmaras de gás eram apenas um pequeno detalhe na história da Segunda Guerra Mundial), sua filha, Marine, defende causas conservadoras embora faça de tudo para se desvincular da postura agressiva. Nesse ano de 2014, por exemplo, Marine entrou em um processo legal de difamação contra Jean Luc Melenchon, presidente do Front de Gauche, por havê-la chamado de fascista.

Sem nenhuma dúvida, a imagem mais palatável de Marine é um atrativo para eleitores que antes nunca pensaram em votar no Front National, como por exemplo imigrantes que obtiveram a cidadania francesa e que veem os postos de trabalho que possuem ameaçados pela nova onda de imigrações ilegais. Mas esse fenômeno de mascarar o radicalismo de direita do partido não é em nada consistente: tão logo foram eleitos prefeitos do Front National, anunciaram que nas escolas municipais sob a jurisdição do partido a única carne a ser preparada na cantina seria a de porco, excluindo crianças judias e muçulmanas do refeitório – tal decisão administrativa em nada se difere das Leis de Nuremberg, no que diz respeito à intervenção corporal por parte da administração estatal com finalidades de excluir um grupo religioso.

A cruzada nacionalista de Le Pen, sob a égide do discurso ”unidos os franceses são invencíveis”, obteve resultados inéditos e assustadores. Mas nem todos os partidos políticos de direita estão preocupados na esterilização da sua imagem, como os neonazistas gregos e húngaros. Essa heterogeneidade da nova direita europeia em ascensão é também um impeditivo para as possíveis alianças. O UKIP britânico e a direita nórdica receiam uma aliança com o Front National, devido à imagem racista e antissemita cultivada por anos pelo partido. Por outro lado, o próprio Front National se recusa a fazer alianças com os neonazistas, visto que quer se distanciar dessa imagem.

Entretanto, essa é apenas parte da hipótese: as mudanças nas expectativas gerais da população francesa com relação a seu futuro parecem ter criado todo o ambiente para a ascensão do Front National; apenas a pedra de toque de uma situação muito mais enraizada na história do que se imagina.

As cruzadas moralizantes/

Enquanto fazia meu mestrado em Paris, os últimos três domingos seguidos em que estava na cidade foram marcados por grandes manifestações de direita: contra a aprovação do casamento gay, contra aquilo que no debate nacional ficou estupidamente marcado pelo nome de ”teoria do gênero”, a favor da revogação da lei do aborto, entre outras pautas conservadora. Uma verdadeira cruzada moral, organizada e reinvindicada sobretudo por jovens, e que abriam espaço para todos os tipos de manifestações antissemitas, anti-imigrantes e antiesquerda.

Foi na semana imediatamente posterior a essa série de manifestações que moviam a cidade toda, que terminei minhas matérias obrigatórias e resolvi ir embora: o clima de tensão era muito pesado, e a sensação de que se estava afundando, de que se adentrava cada vez mais em uma espécie de beco sem saída, era muito angustiante.

De um certo modo, a frase pronunciada pelo meu amigo continha algo daquilo que eu sentia. Se a França havia conseguido criar o mito para si mesma de um Império, de uma potência mundial sobretudo no campo cultural, a sua decadência no plano econômico significa também o desaparecimento daqueles que sempre se opuseram de maneira radical a esse projeto. A impressão hoje é diametralmente oposta daquela do início do século passado: a Paris que atraia intelectuais e artistas devido ao ambiente rico em ideias liberais deixou espaço para uma França retrógrada, em que qualquer medida de atualização de legislação vem acompanhada de uma reação violenta daqueles que sentem ter perdido algo definitivamente.

Um país que se confronta hoje com as realidades que subsistiam à ilusão que criara de si e para si. Historicamente, a França nunca reconheceu a existência de um governo fascista como o de Pétain, e muito pouco se fala da colaboração. O espaço público faz questão de assegurar o lugar de De Gaulle (um general que sequer participou do Dia D e manteve sua esfera de poder por duas décadas) e dos mártires e vítimas, esquecendo-se dos colaboradores e tratando o nazismo como um problema exclusivo do invasor alemão. A capacidade de mascarar erros históricos está, na minha opinião, na origem da sensação de desespero que se vive no país: é evidente o descompasso de um passado construído apenas a partir de adjetivos qualificativos chocando-se com o desespero de um presente e futuro que se veem perdidos. Quanto maior a imagem do passado que se cria, maior a vertigem diante da queda.

A ineficácia das propostas políticas, e falta de entusiasmo e expectativa da população com relação a possíveis mudanças é também um traço em nada negligenciável. A sensação que tenho é a de uma fotografia que por muito tempo manteve-se em vigor, e que começa a destroçar-se de modo irremediável. Diante dessa queda, diversas linhas políticas do século XX tentam rejuntar os pedaços desse quebra-cabeças, tentando recompô-lo, sem espaço para nenhuma nova composição. Essa, talvez seja uma imagem que tem pontos que podem ser expandidos para outros países da Europa Central e Ocidental: a socialdemocracia (os chamados partidos de centroesquerda) tentam lutar pelo reestabelecimento do Estado de bem estar social, colocado em cheque desde os anos 80 (Reagan e Thatcher); a centrodireita (ou neoliberais), continuam defendendo o modelo de reformas imposto desde a década de 80, em que a redução da intervenção estatal se reatualiza diante a pretensa necessidade da política de austeridade; extremadireita e extremaesquerda reencenam conflitos ideológicos tradicionais do pré-Segunda Guerra Mundial.

Nesse cenário parecem existir poucas ideias novas, pouco espaço para uma política que fuja das mesmas cartas marcadas permanecem em jogo há pelo menos 30. A figura de Melenchon,do Front de Gauche parece-me ainda a mais atraente, pelo menos do ponto de vista da coerência de suas posições e declarações – vale sempre deixar claro.

A chamada centroesquerda (o Partido Socialista do presidente Hollande) tem ganhado antipatia crescente da população, diante de medidas de inovação tímidas (como a ampliação da categoria de família, a implementação de cartilhas de orientação sexual que fujam do modelo heteronormativo e a dinamização da economia), mas que recuam diante dos menores protestos.

O único outro partido que apresenta uma proposta coerente entre os termos que propõe é o Front National e daí o seu apelo e perigo. Centrado em um conservadorismo exacerbado, ganha peso na representação a nível europeu, e junto com o UKIP britânico são os mais assustadores, por promoverem um tipo de nacionalismo e chauvinismo que há muito se imaginou extirpado do continente.

Angela Merkel disse, em determinado momento, quando rebatia críticas céticas ao processo de ”modernização” neoliberal proposto por ela, que essas eram questões pertinentes na velha Europa, e que hoje estaríamos diante da nova Europa. Ao contrário do que preconizou a premiê alemã, velhas ideias continuam protelando o antigo.

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Texto publicado originalmente no blog Gusmão.

O “Nakba Day”

O dia 15 de Maio, comemorado por israelenses e judeus do mundo inteiro como o aniversário da Declaração de Independência do Estado de Israel no calendário solar, é também lembrado por palestinos e simpatizantes de sua causa como o “Yawm an-Nakba”, o “Dia da Catástrofe”, modo como a memória coletiva palestina marca o deslocamento forçado de aproximadamente 750 mil palestinos e a destruição de mais de 530 vilas no período da Guerra de Independência de Israel, em 1947-1949. Neste último Yawm an-Nakba, a Educational Network For Human Rights in Palestine/Israel (FFIPP-Brasil), com a qual viajei para Israel e para a Cisjordânia nas últimas férias, promoveu uma mesa de debates na PUC-SP para marcar a data.

Rafael V. Levy, que já trabalhou voluntariamente em campos de refugiados palestinos no Líbano em Julho de 2013, e através da FFIPP no campo de Aida, em Belém, na Cisjordânia, em Janeiro de 2014, introduziu seu discurso com uma fala sobre suas origens. Filho de pai judeu, Levy considera que foi criado dentro da narrativa sionista tradicional, segundo a qual os diversos regimes árabes que declararam guerra a Israel quando de sua criação, em 1948, teriam dito à população palestina para “deixarem suas terras temporariamente, e, quando acabarmos de jogar os judeus ao mar, que retornem”.

Sob esta narrativa incompleta, fica implícito que foram os governos da Síria, Líbano, Jordânia e outros que, derrotados por Israel, não teriam deixado os refugiados voltarem; ou então seriam os próprios palestinos que, por algum motivo oculto, não desejariam retornar. Não fica claro. Esta versão da história não pretende iluminar o passado ou explicar o presente, mas sim eximir Israel de qualquer culpa nos dois. Na verdade, o êxodo dos palestinos começou antes da Declaração de Independência e da intervenção dos vizinhos árabes, já em 1947, com o anúncio do fim iminente do Mandato Britânico e o estouro de uma guerra civil. As milícias sionistas Haganah e Irgun não só expulsaram forçosamente os vilarejos, como também fizeram alguns massacres em pontos estratégicos, para “liberar” áreas e espantar a população de vilarejos circundantes. Ao final, incluindo refugiados e Pessoas Internamente Deslocadas (IDP), cerca de 85% da população palestina no território acordado a Israel na trégua de 1949 foi afetada pelas expulsões.

Em seguida, Levy falou sobre a situação no campo de Aida, e sobre a atuação da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA). A UNRWA opera independente da ACNUR, agência responsável pelas outras crises de refugiados mundo afora. Aos 750 mil refugiados iniciais de 1947-49 foi negada a cidadania nos novos países, enquanto o status de refugiado foi legado aos descendentes nascidos no exílio. Hoje, mais de quatro milhões de pessoas são

reconhecidas como refugiados palestinos pela UNRWA. Além destes, aproximadamente outros cinco milhões seriam refugiados não reconhecidos. Em 1967, com a Guerra dos Seis Dias, Israel passou a ter controle sobre os refugiados nos territórios da Cisjordânia, Gaza, Golan e Sinai.

Foi mostrado à plateia um vídeo da organização Badil (“alternativa”, em árabe) feito no campo de Aida, no qual se entrevista o professor Amjad Qassis, que fala do processo contínuo da Nakba, até os dias atuais (a chamada “ongoing Nakba”); “Israel impede o retorno dos refugiados ao mesmo tempo em cria mais refugiados” diz o professor a certa altura. Aida é ladeado pelo muro israelense de separação e, apesar de estar localizado dentro de Belém, e ser, portanto, Área A, sob controle completo da Autoridade Palestina, ainda é alvo de incursões regulares do exército, muitas vezes em resposta a crianças palestinas que quase diariamente atiram pedras contra as torres de vigia do muro. Durante a entrevista a céu aberto de Mohammed Al-Azza, morador do campo, é possível escutar sons de tiros ao fundo.

Em seguida falou o professor Reginaldo Nasser, coordenador do curso de Relações Internacionais da PUC-SP. Nasser achou interessante que Levy tivesse decidido introduzir sua fala contando sobre suas origens, e a partir daí começou a tecer uma crítica à visão maniqueísta com que muitas vezes são vistos os conflitos no Oriente Médio; deu o exemplo da fala do diplomata Rubens Ricupero, que via a questão Israel-Palestina como um “conflito religioso”. Segundo Nasser, esta seria uma ideia errônea de que tais conflitos são “exóticos, distantes”, como se as questões que hoje afetam diariamente a vida de israelenses e palestinos tivessem alguma relação direta com os tempos bíblicos e não fossem fruto de projetos nacionais e interesses econômicos; como algo “quase genético”. Na verdade, a questão da Palestina é relacionável com outros contextos mundo afora, como a África do Sul, a Irlanda do Norte e a periferia de São Paulo.

Nasser também chamou atenção para pontos positivos da sociedade israelense, que estaria passando por uma “transformação social” graças à ação de ONGs israelenses de direitos humanos, como B’Tselem, responsável por documentar e divulgar para a sociedade israelense as violações de recorrentes nos Territórios Ocupados e zelar pelo cumprimento à lei internacional por parte de Israel; e Shovrim Shtikah (Breaking the Silence), que reúne veteranos do exército israelense que serviram na Cisjordânia desde a Segunda Intifada, prestando testemunhos e expondo ao público israelense o que é feito em nome de sua “segurança”, além de promover passeios de turismo político para denunciar a ocupação em Hebron. Estes grupos, diz Nasser, têm sofrido algum grau de pressão e restrições por parte do governo israelense, como na proposta de lei no Knesset que pretende listar ONGs que recebem fundos do exterior como “agentes estrangeiros”.

Seguiu a fala de Lenora Bruhn, que estagiou pela FFIPP no Vale do Jordão, região desértica de Área C na fronteira com a Jordânia, e, portanto, considerada território estratégico para Israel. As pequenas vilas palestinas, muitas vezes compostas por não mais que algumas tendas improvisadas, lidam com uma escassez crônica de água, que contrasta com a abundância verificada nos assentamentos logo ao lado, obra da política de preços discriminatória praticada pela empresa hídrica israelense Mekorot. Lenora explicou que, pela lei internacional, Israel, enquanto potência ocupante, deve zelar pelo bem-estar da população civil dos Territórios Ocupados, o que claramente não ocorre. A transferência de população civil israelense para a Cisjordânia, para assentamentos como Roi e Bekaot, também constitui uma violação das obrigações de Israel como agressor.

Atualmente, apenas 1% da terra no Vale do Jordão é destinada ao desenvolvimento; enquanto isso, 95% das aplicações feitas ao comando militar pela população palestina local para poder realizar novas construções são rejeitadas. Como consequência, a grande maioria das construções palestinas é considerada ‘ilegal’ pela lei militar israelense, e está sujeita a demolições regulares, como de fato ocorre com casas, tendas, escolas, centros comunitários e estabelecimentos comerciais no Vale. O efeito disso é a impossibilidade de uma vida normal e do pleno desenvolvimento pessoa e coletivo no longo prazo.

Por fim, falou a professora Mariane Gennari, que estagiou na Baladna, organização de sociedade civil que atua na comunidade palestina de Haifa. Mariane contou sobre os chamados “palestinos de ’48” (também conhecidos como “árabes-israelenses” ou “palestinos-israelenses”, todos termos com diferentes conotações políticas), descendentes da população palestina que não foi obrigada a se deslocar, ou de IDPs. Os palestinos-israelenses viveram sob lei militar até 1966, e não raro enfrentaram expulsões subsequentes à guerra de 1948, estendendo-se até o final da década de 1950. No Dia da Terra (“Yawm al-Ard”, 30 de Março) de 1976, muitos palestinos-israelenses decidiram demonstrar a memória de sua tragédia coletiva através de uma greve geral nas principais cidades palestinas da Galileia, como Nazaré, Sakhnin e Shefa-Amr. Esta ação de desobediência civil por parte de cidadãos israelenses foi reprimida pelo exército, que matou seis grevistas.

A educação dos palestinos-israelenses é ministrada em escolas públicas separadas, nas quais estes aprendem o hebraico e sobre a história judaica e de Israel, mas onde o conhecimento sobre história e cultura árabe e palestina é escasso. Para Mariane, a lógica por trás desse sistema é de retirar-lhes a identidade palestina e os inserir marginalmente na cultura israelense. A ação de organizações como a Baladna está focada em promover entre a juventude sua cultura e tradições diferenciadas, e impedir sua assimilação completa na sociedade israelense.

Gennari falou sobre as celebrações simbólicas feitas na vila cristã de Iqrit, cujos habitantes foram expulsos e suas casas bombardeadas no Natal de 1951, muito depois

da Guerra de Independência. Todos os anos, jovens descendentes de IDPs de Iqrit, vindos de cidades como Haifa, Nazaré e outras, se encontram nos destroços da vila para acampar durante alguns dias e renovar a memória da expulsão e a esperança de retorno. Apesar de muitos morarem a apenas alguns quilômetros de Iqrit, não lhes é permitido retornar e reconstruir as casas de seus antepassados. Em sua estada com os jovens, Mariane também comentou a situação dos palestinos cristãos, que não estão isentos do serviço militar, mesmo que muitos o recusem por razões abertamente políticas.

A questão dos refugiados é talvez a mais polêmica de todas envolvendo o conflito Israel-Palestina, porque se encontra na gênese da própria criação de Israel. Discutir a questão dos refugiados e seu direito de retorno, estipulado na Resolução 194 da ONU, significa ir além do debate sobre a ocupação da Cisjordânia e de Jerusalém Oriental de 1967 e questionar – segundo muitos, deslegitimar – as bases do Estado judaico. Em todas as rodadas de negociações de paz realizadas entre Israel e a Autoridade Palestina até hoje, os refugiados estavam fora de discussão, dado o consenso quase geral de que o seu retorno imediato e em massa, além de impensável em termos de infraestrutura e logística, resultaria no fim da maioria judaica. Este cenário é inaceitável para sionistas, sejam eles liberais ou não, e muitos defendem soluções ‘alternativas’ à questão, como compensações financeiras aos descendentes de refugiados, e/ou sua integração total como cidadãos de pleno direito nos países em que vivem (o que lhes foi muitas vezes negado pelos governos destes países). Os defensores do retorno alegam que isto ainda assim não atenderia às estipulações da Resolução 194, e que o direito a voltar às terras perdidas em 1947-49 é inalienável e indispensável enquanto parte de uma solução justa e baseada nos direitos dos povos.

Uma série de problemáticas é depreendida desta discussão inicial (“Os refugiados devem ter o direito a retornar?”), todas as quais necessitarão, no contexto de uma eventual solução, de respostas definitivas. Se sim: o retorno deve ser feito de maneira gradual? Como evitar um colapso estrutural ao assentar aproximadamente cinco milhões de pessoas num território cuja população atual é de cerca de oito milhões? Como evitar que surjam confrontos sectários? Como resolver disputas territoriais privadas? Como integrar os refugiados e a população judaica? Como será feita a transformação política em direção a um único Estado que cubra todo o território de Israel, Cisjordânia e Gaza, e como garantir que este Estado seja democrático? Se não: como compensar os refugiados e seus descendentes? Como derrubar as muralhas dos campos e garantir que aqueles se tornem jordanianos, sírios, libaneses e palestinos de pleno direito? Como levar adiante a solução de dois Estados?

A questão fundamental que o problema dos refugiados postula para o conflito Israel-Palestina (e inúmeros outros conflitos mundo afora) é: Qual é a melhor concepção a ter em vista quando pensando e trabalhando a resolução do conflito Israel-Palestina? A concepção da autonomia e independência política de cada comunidade em Estados-

Nação soberanos, com respeito às suas identidades socioculturais coletivas e a seu desenvolvimento endógeno? Ou a concepção de integração e assimilação social e política das comunidades em um único Estado binacional, por mais distante e impraticável que isso pareça? E seria possível uma via média entre estas duas visões?

Palestra: Teoria dos Jogos e as Negociações de Paz no Oriente Médio

Na próxima segunda-feira, dia 9 de junho, às 20:30, o Rabino Dr. Elad Dokow da Universidade Technion falará sobre o tema “Teoria dos Jogos e as Negociações de Paz no Oriente Médio” em uma palestra na sede da B’nai B’rith, em São Paulo. (Rua Caçapava, 105, 4o. andar – Jardins  – São Paulo-SP). Para participar, é necessária a confirmação prévia com a Rafaela pelo email: rafaela@forum18.com.br

Elad Dokow é Pós Doutorado em Matemática pela Universidade Technion. Foi Professor do Departamento de Economia da Universidade Bar-Ilan em Israel, Professor Assistente do Departamento de Economia da Universidade Carlos III de Madrid e atualmente é o Rabino da Universidade Technion. A Teoria dos Jogos está presente em sua área de ensino e pesquisa.

Organização: B’nai B’rith/ Bnei Akiva/ Fórum 18

Elad Dokow - evento

O AMOR NÃO É CEGO – Paixões estúpidas são

Imagine que você ama alguém. Qualquer alguém. Um homem, uma mulher, seu filho, seus pais… Agora pense em uma situação na qual essa pessoa tenha errado. Ou que ela esteja tendo uma conduta que não seja produtiva para si própria e para o mundo. Ou, ainda, que ela esteja agindo de uma forma prejudicial: matando aulas, faltando ao trabalho, sendo hostil, bebendo muito, etc. Você não falaria isso pra ela? Não chamaria sua atenção? Aconselharia ela a mudar de hábitos?

Pare e pense nesta hipótese. Se você a ama, sua resposta provavelmente foi sim. Se não é amor, pode ser que se deixe passar. Aquele amigo que na verdade é mais um colega de night ou aquela ficante mais ou menos que nunca vai virar namorada. Eles fazem o que querem com suas vidas, não nos importa tanto assim. As pessoas que nós amamos, chamamos a atenção, criticamos construtivamente e damos conselhos. Porque queremos que elas sejam felizes, produtivas, que tenham vida longa. Queremos ajuda-las.

Esse texto vai para alguns sionistas. Se vocês amam Israel, critiquem-no. Percam o medo de aceitar que o país não é perfeito, que comete erros, que pode mudar suas políticas. Deixem de achar que existe tal coisa como uma nação ideal com ações ideais. De buscar explicação para cada ato que parece inexplicável. De achar que a culpa é sempre do outro. Se você que está lendo está em algum lugar legal agora, em uma profissão almejada, em uma família feliz, em um grupo de amigos maneiro ou morando sozinho independentemente, você chegou aí porque seus pais ou alguém te ensinou que não se pode achar que a culpa é sempre do seu coleguinha, ou mesmo do mundo – inferno astral, né? Surpresa! Nós erramos. Eu, você… absolutamente cada um de nós. E é errando que se aprende e aprendendo nós mudamos aquilo que não está lá muito legal da nossa parte.

Esse texto super direto, metafórico mas não tanto, simples até demais, é em resposta a uma situação que era para ter sido linda e se tornou estúpida. Que nem briga de criança. Há uma semana e meia ocorreu a palestra de um Professor da Unicamp proveniente do Egito, Mohamed Habib, no Hillel Rio. Foi no dia 21 de Maio, sobre as perspectivas entre Israel e Palestina, e foi show.

Para começar, o Professor Mohamed é um fofo (aham, fofo). Super gentil, educado, paciente. Em segundo, ele tem experiência quando o assunto é o conflito Israel-Palestina. Em terceiro, se nada disso acima fosse verdade, ele falou bonito no dia.

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Nascido e crescido no Egito, o Mohamed Habib é engenheiro agrônomo, com mestrado e doutorado. Atuando na UNICAMP desde a década de 1970, ele também foi Vice-Presidente do Instituto de Cultura Árabe.

A palestra do Habib deu o que falar. No dia mesmo tinha gente escrevendo que era um absurdo o Hillel realizar este tipo de evento. Dentre as retóricas sem fim e repetitivas – que para mim parecem senso de ameaça a uma opinião pessoal que se soprar, derruba – estava a Nakba. O assunto proibido dentre muitos judeus. Eu cresci em escola judaica, fiz parte ativa de movimento juvenil, ingressei na faculdade de História aos 18. Só descobri que a Nakba existia depois dos meus 20 anos. Que coisa. Agora eu paro e penso, como é que eu podia me atrever a falar, opinar, criticar sobre a história do Estado de Israel se eu sequer tinha o conhecimento da Nakba? Algo que faz parte, uma bela parte, dessa história?

O Professor Mohamed não falou nada sobre a Nakba. A palestra nem era sobre isso. Mas por que será que assusta tanto? Não diga que você quer a paz. Não diga que se “o outro” abaixar as armas, teremos paz. Não fale asneiras, porque é isso que você está dizendo se não se propõe a escutar a narrativa dele. Escutar como ele vê a história não desmente a forma como você vê a sua. Nem ameaça. A não ser que você não tenha lá muita certeza do que vê. Falar de Nakba, explica-la, entende-la é amar, e muito, Israel. Não falar dela, fingir que ela não existe (o que parece também coisa de criança – fingir que o coleguinha com o qual brigamos não existe), isso é muita falta de amor a uma instituição que se visa defender, que se procura dignificar. Porque aí, quando alguém vem perguntar a respeito e você fala “sobre isso nem me dou ao trabalho de comentar”, meu amigo… Tudo o que você fez foi acabar com a sua fala, com a sua legitimidade de discutir o assunto e ajudou a queimar a imagem daquilo que você estava tentando defender, já que é algo que não enxerga o outro lado, que não discute, que tem verdade pronta e inquestionável.

O mundo não pode ser inquestionável. E, pra sua surpresa (provavelmente), nem o sionismo é ou nunca foi. De Pinsker, passando por Herzl e Ahad Ha’Am chegando a Gordon e Borochov e, enfim dando espaço ao Rabino Kook (tendo omitido aí uma galera), muita água rolou nesse rio. Água que nunca desembocou no mesmo mar, se você quer saber. E o Estado está aí, da praticidade à politização, discussões sobre o ser judeu cultural, socialista e religioso, se formou um Estado. Porque você não quer discutir, criticar, ter opiniões adversas, se foi isso que os primeiros teóricos fizeram?

Mas enfim. Nem foi sobre a Nakba. Ele falou sobre paz. Sobre ser pacifista, a prática. A opção de vida, diria eu. Ele deu conselhos sobre como um peacebuilder deve agir, deve trabalhar na sua formação. Utilizou exemplos de como os governos (todos os governos) do Oriente Médio se aproveitam desse conflito, enquanto quem luta ele são exércitos e civis. Ele falou da vida que tinha no Egito, junto com judeus e cristãos e como faz o mesmo aqui até hoje. Mohamed Habib é muçulmano, esqueci de mencionar. Ele falou sobre como planta moloheia com seus vizinhos e disse que, na opinião dele, um acordo é inevitável. Que de repente nem ele e nem ainda nós vejamos isso acontecer, mas em breve vai acontecer.

Eu já ouvi bastante gente falar sobre o assunto. E muitas pessoas que falam sobre coexistência, também. Acho que o Habib foi a pessoa que menos pé atrás tinha, menos freios, nem um pouco na defensiva. Senti sinceridade absoluta. E estou falando isso porque cheguei a escutar até que o cara queimou bandeira de Israel em algum momento. Aí fui procurar e fiquei mais de uma hora catando sobre o histórico dele na internet. Não achei nada. Mas parei, porque percebi que as pessoas que o estavam criticando e, principalmente, criticando o Hillel pelo evento, não tinham razão mesmo se ele tivesse queimado coisas. Elas estavam criticando cegamente. E se ele tivesse queimado, me tira o direito de escutar o porquê ele fez isso? Não é melhor eu saber o motivo de uma coisa que eu acho errada para poder explicar que ela está errada e que pode ser diferente? Ou vai me dizer que você bate nos seus filhos sem explicar porque o “não pode”?

Se você estiver pensando em me responder dizendo que eu não procurei direito, ou que parei de procurar antes de achar que ele escreveu contra o Estado de Israel, não se dê ao trabalho. Eu li os artigos do Professor. Ele escreveu sobre a transgressão daResolução 242 do Conselho de Segurança da ONU e sobre os direitos dos palestinos de ter um Estado. E repito: não achei nada que ele tenha escrito contra Israel.

Infelizmente, a paz não pode ser feita como num aperto de mão após uma briga de crianças. “Agora pede desculpas e dá um beijo”. No mundo dos adultos, a paz acontece quando os dois ou mais lados do conflito se escutam, se perdoam e chegam a um acordo. Sem diálogo, não tem paz. Se você não quer ouvir o que o outro tem a dizer, colega, não é diálogo, pra começar. Logo, veja só, você provavelmente não quer a paz. Querer a sua versão do que é melhor pro mundo é outra história, algo como ditadura, já ouviu falar? Aconteceu no Brasil há 50 anos.

O Estado de Israel completou 66 anos de vida em 2014. Nesse meio tempo muita coisa mudou. O Estado avançou em tecnologia e ensino, é primeiro mundo no quesito saúde, possui uma diversidade enorme de instituições de coexistência e absorção. E você? Está preparado para amadurecer? Você sempre vai ser livre para ter a persistir em sua opinião. Só precisa realmente saber do que está falando. Porque já sabe, né? Se não sabe brincar, melhor não descer pro play.

Ficou claro ou quer que desenhe?

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Texto publicado originalmente no blog Oriente Médio Hoje.

Este e outros textos da autora podem ser conferidos em http://www.jornal.ceiri.com.br/author/carla/

ADL Global 100 Index: Mais de um quarto da população mundial possui crenças antissemitas

A Liga Antidifamação (ADL) divulgou, no dia 13 de maio, os resultados de uma pesquisa mundial sobre crenças antissemitas. O ADL Global 100 apresenta uma pesquisa em que 53.100 adultos em 102 países foram questionados sobre 11 esteriótipos antissemitas, no esforço de estabelecer pela primeira vez uma ampla pesquisa baseada em dados do nível e intensidade do sentimento anti-judaico em todo o mundo.

Abraham H. Foxman, diretor nacional da ADL, considera que a pesquisa expressa, pela primeira vez, uma noção real de como o antissemitismo generalizado e persistente está presente no mundo. Ainda segundo Abraham H. Foxman, “os dados nos permitem olhar além de incidentes e retóricas antissemitas e quantificar a prevalência de atitudes antissemitas em todo o mundo. Podemos agora identificar os focos, bem como os países e regiões do mundo onde o ódio aos judeus é essencialmente inexistente.”

A ADL contratou as empresas de pesquisa First International Resources e Anzalone Liszt Grove Research para realizar a pesquisa de atitudes em relação aos judeus. Os dados foram recolhidos a partir de entrevistas realizadas entre julho de 2013 e fevereiro 2014, em 96 idiomas e dialetos por meio de questionários feitos por telefones fixos, celulares e pessoalmente.  A margem de erro para a maioria dos países, onde foram selecionados 500 entrevistados, é de +/- 4,4 por cento. Em vários países maiores, onde foram realizadas 1.000 entrevistas, a margem de erro é de +/- 3,2 por cento.

Para cálculo do índice de anti-semitismo, foi considerado o número de pessoas, em porcentagem, que responderam como “verdadeiro” a 6 ou mais questões entre 11 questões caracterizadas por esteriótipos negativos sobre judeus. O índice representa o número de pessoas com crenças antissemitas. Abaixo, listadas as 11 questões:

  • Judeus são mais leais a Israel do que ao país onde vivem?
  • Judeus possuem muito poder no mundo dos negócios?
  • Judeus possuem muito poder no mercado financeiro internacional?
  • Judeus falam demasiadamente sobre o que aconteceu com eles no Holocausto?
  • Judeus não se importam com o que acontece com qualquer pessoa, exceto com os seu próprio povo?
  • Judeus possuem muito controle sobre assuntos internacionais?
  • Judeus possuem muito controle sobre o governo norte-americano?
  • Judeus pensam que são melhores do que as outras pessoas?
  • Judeus possuem muito controle sobre a mídia internacional?
  • Judeus são os responsáveis pela maior parte das guerras pelo mundo?
  • Pessoas odeiam os judeus por causa da maneira como os judeus se comportam?

O índice classifica os países e territórios do menos antissemita (Laos, em 0,2 por cento) ao mais antissemita (Cisjordânia e Faixa de Gaza, em 93 por cento), vale ressaltar que a pesquisa do índice não entra no mérito, de forma direta, sobre questões em relação ao sionismo e ao Estado de Israel.

A pesquisa constatou que as crenças antissemitas estão presentes no mundo. Mais de um em cada quatro adultos, 26 por cento dos entrevistados, cerca de 1.09 bilhão de pessoas, estão profundamente infectados com opiniões antissemitas. No Brasil, o número de adultos que possuem crenças antissemitas foi de 16 por cento, cerca de 22 milhões de pessoas.

A maior concentração de entrevistados com crenças antissemitas foi encontrada no Oriente Médio e países do Norte Africano (“MENA”), onde quase três quartos dos entrevistados, 74 por cento, concordaram com a maioria dos estereótipos antissemitas. Sendo, o Irã, o país da região do MENA com o menor índice de antissemitismo, com 56 por cento.  Os países fora da região do MENA têm um valor de índice médio de 23 por cento.

Todavia, de acordo com a ADL, há também algumas observações positivas e animadoras. Na maioria dos países de língua inglesa, a percentagem de pessoas com crenças antissemitas é de 13 por cento, muito inferior à média geral. Países de maioria protestante têm as mais baixas avaliações de crenças antissemitas, em comparação com qualquer outro país de maioria religiosa. E 28 por cento de todos os entrevistados não acreditam que qualquer um dos 11 estereótipos antissemitas avaliados seja “verdadeiro”.

A respeito do tema Holocausto, a pesquisa aponta que apenas 54 por cento de todos os entrevistados já ouviram falar do Holocausto, e que duas em cada três pessoas entrevistadas ou nunca ouviram falar do Holocausto ou não acreditam que os relatos históricos sejam exatos. Entre os entrevistados brasileiros, 79 por cento já ouviram falar do Holocausto, e 61 por cento ou nunca ouviram falar do Holocausto ou não acreditam que os relatos históricos sejam exatos.

Quanto ao tema Israel e Oriente Médio, de todos os entrevistados, 35 por cento possuem uma opinião favorável a Israel e 36 por cento possuem uma opinião favorável a Palestina. Entre os entrevistados brasileiros, 57 por cento possuem uma opinião favorável a Israel e 43 por cento possuem uma opinião favorável a Palestina. Em tempos que discute-se sobre a existência de uma relação entre antissemitismo e antissionismo, penso que poderiam ter feito mais perguntas sobre Israel e sionismo, ou até ir mais além e criar também um índice de antissionismo. Seria interessante comparar os índices de antissionismo com antissemitismo.

Sabemos que o antissemitismo é um fenômeno quase inexplicável, e a pesquisa da ADL está aí para provar. Por exemplo, por que nos EUA, as opiniões antissemitas são indiferentes ao gênero, isto é, homens e mulheres possuem o mesmo índice, mas na Nova Zelândia, os homens possuem um índice bem maior do que as mulheres? Por que o Panamá ultrapassa em muito todos os outros países das Américas, com um índice de 52 por cento? Por que há um índice tão baixo nas Filipinas, apenas 3 por cento? Por que a Malásia, um pais em que a presença judaica chega a ser quase nula, possui um alto índice de 61 por cento? Seria possível identificar as causas do grau de antissemitismo dos países?

Bem, os resultados existem para serem interpretados, porém é necessário ter bastante cautela para não cometermos equívocos. Há um livro, no mínimo interessante, cujo nome é Freakonomics, que aponta o problema em teorias que são muitas vezes validadas por correlações que não significam necessariamente causa e efeito. É preciso analisar bem a situação para encontrar a relação correta de casualidade, a fim de não cometer o erro da lenda do czar que foi informado de que a província com maior incidência de doenças era também a que contava com mais médicos. Sua solução? Mandou imediatamente fuzilar todos os médicos. A pesquisa da ADL pode nos mostrar fortes correlações entre algumas nações e religiões com o antissemitismo, porém antes de apontarmos uma relação de causa e efeito, devemos nos lembrar que o antissemitismo, definitivamente, não é um fenômeno tão fácil de ser explicado.

Em tempo, este artigo foi elaborado antes dos trágicos acontecimentos em Bruxelas e Paris. Ao ler sobre o assassinato no Museu Judaico de Bruxelas, logo fui checar o índice de antissemitismo da Bélgica, cujo valor é 27 por cento. O da França é 37 por cento. Será que é possível quantificar o antissemitismo? Ranquear os países? Será que um índice bem abaixo que a média mundial, como os 16 por cento do Brasil, traduza que o antissemitismo não é preocupante no tal país? Creio que não, o índice da ADL serve para comparar e analisar os países, porém, não é possível concluir se o Brasil é muito ou pouco antissemita, se países com índices acima dos 26 por cento serão, necessariamente, mencionados em notícias, ao redor do mundo, como local de atos antissemitas, e países com índices bem abaixo dos 26 por cento estarão livres desse mal. A pesquisa traz uma única certeza: o antissemitismo ainda está presente e precisa ser combatido.

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Mais informações sobre o ADL Global 100, inclusive comparações país por país, estão disponíveis on-line em http://global100.adl.org/

A Liga Antidifamação, fundada em 1913, é a organização líder mundial de combate ao antissemitismo por meio de programas e serviços que neutralizam o ódio, o preconceito e a intolerância.

Iom Haatzmaut 2014 – 66 anos do estabelecimento do Estado de Israel

Como explicar o sionismo hoje, quando o nacionalismo lembra, para muitos, xenofobia, discriminação, opressão, autoritarismo ou até fascismo?

Celebrar o “orgulho de ser judeu” ou as “conquistas do estado judeu” não parecem uma provocação aos inimigos, uma ostentação de força militar e uma afirmação de “superioridade”?

Quem acha isso (judeu ou não-judeu) não entende a essência do sionismo.

Foto: Gabriel Douek

Foto: Gabriel Douek

Quando, em meio aos pogroms, perseguições, leis de Nurenberg e humilhações, alguns pensadores ousaram propor o restabelecimento da soberania judaica na Terra de Israel, essa ideia não era uma “afirmação de superioridade”, mas muito pelo contrário: o sionismo é um grito por igualdade.

Os primeiros sionistas perceberam que, se em muitos países os judeus têm dificuldades de se tornar cidadãos iguais, precisam criar seu próprio país para serem cidadãos plenos.

Se em outros lugares os judeus sofrem risco de expulsão, precisam de um lar que sempre os aceitará.

Se a contribuição cultural e espiritual dos judeus à humanidade era menosprezada e desvalorizada, num novo país o povo judeu daria a sua contribuição ao mundo como uma nação independente, vivendo em paz e igualdade ao lado das demais.

A própria ideia de um estado judeu mostra o quanto o sionismo sempre almejou a igualdade: espelhou-se nas ambições de outros povos – italianos, gregos, belgas etc – que encontraram na autodeterminação política o meio de exercer sua identidade.

E não uma forma de suprimir direitos de outros, como foi feito aos judeus na diáspora. Assim como é impensável negar aos judeus os direitos à igualdade civil e à soberania política, também é impensável negar esses mesmos direitos a outros povos ou minorias.

O sonho sionista é simplesmente esse: a construção de um país que seja o lar nacional do povo judeu, onde ele possa viver intensamente e com plenitude seus valores, sua cultura e sua língua hebraica, na terra onde se constituiu como povo, exprimindo sua diversidade numa sociedade forte, democrática, vibrante e plural, e em paz com seus vizinhos.

Ainda não estamos lá, e talvez ainda falta muito. A implementação do sonho sionista passou por guerras, crises, dificuldades, conflitos internos e externos. Mas, como disse Amós Oz, “a concretização de Israel só poderia ser uma frustração, pois a única forma de manter um sonho perfeito e ideal é nunca colocá-lo em prática”.

Israel não é perfeito – nem de perto.

Mas isso não nos impede de celebrar com alegria as numerosas conquistas desses 66 anos: de um pequeno país pobre, isolado e com a existência ameaçada por inimigos, para uma nação próspera, estável, vibrante, democrática, radicalmente multicultural, e em vários aspectos um exemplo para o mundo.

É o momento de celebrar os sucessos – na tecnologia, medicina, academia, música, infra-estrutura, o reflorestamento, os prêmios Nobel e até o falafel.

E ao mesmo tempo, é a oportunidade para pensar nos desafios que estão pela frente: a promoção de justiça social, a integração dos setores da sociedade, o fortalecimento da democracia, e, é claro, a paz com os palestinos e todos os países vizinhos.

Chag Atzmaut Sameach! חג עצמאות שמח

Feliz 66 anos para Israel, e que esse velho-novo país continue sempre trazendo orgulho para os judeus do mundo todo, desenvolvimento para seus cidadãos, progresso para a região e conquistas para a humanidade!

A X Semana do Apartheid Israelense

Na semana entre os dias 24 e 28 de Março ocorreu a 10ª edição da “Semana do Apartheid Israelense” no Brasil, organizada pela Frente Palestina da USP, da qual fazem parte muitos de meus colegas de minha viagem de Janeiro com a Faculty For Israeli-Palestinian Peace (FFIPP). A Semana contou com diversos eventos para a exposição e o debate da Questão Palestina, nos campi da Cidade Universitária da USP, PUC-Perdizes e FMU-Liberdade. Foi interessante e positivo ver engajados em discussão – e, com frequência, em embate –, colegas de curso os quais nunca tinha visto se manifestar a respeito da questão, amigos da comunidade judaica que compareceram para expressar um contraponto sionista ao que viam como um discurso unilateral e parcial, e colegas da FFIPP.

apartheid_israelense_0O primeiro evento foi uma mesa na própria PUC, com o polêmico título “Do apartheid sul-africano ao israelense”.  Na mesa estava um dos meus coordenadores da FFIPP, o jornalista e historiador Arturo Pacheco, acompanhado de ativistas sul-africanos pró-Palestina, um dos quais havia sido um prisioneiro político durante o regime do apartheid, para traçar um panorama histórico da ideologia sionista, seu desenvolvimento até os dias de hoje, e seus paralelos com a segregação na África do Sul. Compareceram alguns amigos meus da comunidade judaica, pretendendo realizar Hasbará, isto é, ‘defender’ Israel contra o que viam como acusações caluniosas. Um de meus amigos foi o mais combativo em suas perguntas, e quando se declarou como “judeu e sionista”, foi recebido com os gritos de uma mulher da plateia – Sara as-Suri, uma palestina nascida na Síria, refugiada da Guerra Civil: “Este não é um espaço de debate, este é um espaço de solidariedade ao povo palestino!”. Outras duas pessoas na plateia, conhecidas por seu ativismo pela causa palestina, o rechaçaram igualmente.

Na 4ª Feira, ocorreu em um auditório da FFLCH a mesa “Direitos Humanos na Copa da FIFA e o apartheid israelense”, contando com Marina Mattar, do Comitê Popular da Copa, e a ativista italiana Maren Mantovani, da organização Stop the Wall. Maren defendeu a campanha internacional de Boicote, Desinvestimento e Sanções (BDS) contra Israel, emulando a mesma tática que foi usada pela comunidade internacional contra a África do Sul segregacionista, e disse que seus recentes sucessos são refletidos pela preocupação das lideranças sionistas. No entanto, Israel teria um ‘plano B’ nos países do Sul Global, cuja prioridade seria a tecnologia bélico-militar de Israel e sua hidrologia, no lugar de preocupações humanitárias. Maren apontou para a cooperação de Israel com a repressão da Polícia Militar aos protestos contra a Copa.

fotoNa 5ª Feira ocorreu a oficina “A ocupação israelense da Cisjordânia”, ministrada pelos próprios membros da Frente Palestina, a maioria dos quais colegas de viagem, e que explicou muitos dos aspectos técnicos da ocupação ilegal, como a divisão da Cisjordânia entre as áreas A, B e C, os checkpoints espalhados ao longo do muro e no interior do território, e o regime de “dois povos, duas leis” vigente nas áreas B e C, que submete colonos israelenses à lei civil (como se vivessem na Israel de jure) e palestinos à lei militar, inclusive detalhando o sistema de detenção administrativa, que permite às autoridades israelenses deter qualquer palestino com base em “evidências sigilosas” sem direito ao contato exterior por 90 dias, por 6 meses indefinidamente renováveis. Alexandre Quintino, um dos membros da Frente, contou de sua experiência estagiando na aldeia de Yanoun, no norte da Cisjordânia, assediada pelo avanço de assentamentos religiosos e nacionalistas como o de Itamar. Adriana Tavares comentou a questão da água na Palestina, e sua distribuição desigual manejada pela empresa israelense Mekorot.

Neste dia, reencontrei o prof. Samuel Feldberg, professor de Relações Internacionais da USP e Rio Branco, quem, em uma de suas palestras no Renascença, foi uma das pessoas que me inspirou a fazer RI. Depois da oficina, o professor conversou com os membros da Frente, e expressou concordância em muitos pontos, revelando inclusive ter visitado os Territórios Ocupados com organizações israelenses como Shovrim Shtikah (Breaking the Silence) e B’Tselem. Foi interessante ver como o professor e os membros da Frente discutiam as questões e o futuro do conflito de forma ponderada e objetiva.

Na sexta, último dia da Semana do Apartheid, foi discutida a situação dos refugiados palestinos em meio à Guerra Civil Síria. A palestra foi aberta pela mesma mulher que se exaltou na mesa de segunda, Sara as-Suri, que abriu com a frase “Uma vida que se define apenas como antítese à morte não é vida”. Sara descreveu o horror sob o qual vivem os refugiados palestinos do campo de Yarmouk, em Damasco, e disse que a luta dos sírios contra Assad é análoga e irmã da luta dos palestinos contra Israel. Mas sua frase que mais impressionou a plateia foi que “Após libertarmos a minha Damasco natal, eu mesma sairei daqui de São Paulo, empunharei uma Kalashnikov e libertarei Jerusalém”. Rafael V. Levy, que estagiou com a FFIPP no campo de refugiados de Aida, em Belém, explicou a atual situação do campo, que está sendo vítima de incursões e bombas de gás lacrimogêneo do Tzahal. Manuel da Furriela, da Comissão de Refugiados da OAB, comentou sobre as especificidades jurídicas da condição do refugiado.

No geral, sinto que a Semana do Apartheid foi a minha primeira experiência desde minha volta de Israel-Palestina em um debate engajado e, em certo grau, aparelhado em ambos os lados. Foi defendido que o evento é abertamente posicionado politicamente e não é neutro nem se pretende assim. Opiniões de Hasbará por parte da plateia logo sempre são esperadas, uma vez que estas de fato não são expressas pela mesa. Porém os próprios organizadores da Semana não esperavam um nível tal de exaltação de alguns setores da plateia e da mesa, especialmente entre os que associam sua militância pró-palestina com sua filiação partidária.

Ideologicamente, as palestras não me representaram uma grande transformação, não ouvi lá nenhuma informação relevante que já não tivesse visto durante minha viagem. Sim, o uso do termo “apartheid” para descrever o Estado de Israel continua a me incomodar – e nem poderia deixar de ser, referindo-se a um país ao qual fui, em toda minha educação judaico-sionista, ensinado a amar e reverenciar. Mas também aprendi, vendo amigos meus dos tempos da escola discutindo com colegas de viagem, que se referir a Israel como uma “democracia” me deixa igualmente desconfortável.

Mulheres palestinas contra “Crimes de Honra”

Em 2013, o número de assassinatos de mulheres palestinas por Crimes de Honra” dobrou. No ano anterior, foram mortas 13 mulheres e, em 2013, 26. Na última semana, o “Palestinian Center for Human Rights” (PCHR) divulgou a morte mais recente, ocorrida em Bani Suheila, uma cidade ao sul de Gaza. A vítima se chamava Islam al-Shami, tinha 18 anos e foi atacada com um faca de cozinha pelo irmão enquanto rezava em seu quarto. O perpetrador, de 21 anos, foi preso e alegou que matou a irmã em defesa da honra da família[1].

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Crimes de Honra” são um fato corrente em muitos dos países árabes e se referem usualmente ao contato considerado indevido entre mulheres solteiras e algum homem. As mortes são causadas por membros masculinos da família, como pais ou irmãos. Segundo ativistas pelos direitos das mulheres, o aumento de tais mortes é resultado da crescente crise econômica em conjunto com a leniência em relação a crimes deste tipo e da aceitação social pela violência contra as mulheres[2].

Além do maior número de mulheres mortas por “Crimes de Honra”, há também a questão da pena para os perpetradores. Geralmente são penalidades pequenas, como prisões de curto tempo, o que facilita sua prática. As mulheres e os ativistas pelos direitos femininos da Palestina pediram esta semana para que o Presidente da “Autoridade Nacional Palestina” (ANP), Mahmoud Abbas, rejeite pontos do “Código Penal” que abrem espaço para tais penas de prisões curtas.

Em 2011, Abbas suspendeu um dos Artigos referentes a esta questão, mas muitos outros permanecem válidos. Segundo Hanan Ashrawi, oficial sênior da ANP e ex-deputada, o presidente da “Autoridade Nacional Palestina” se reuniu com os ativistas em novembro de 2013, mas depois passou o caso para seu representante legal.

Ashrawi faz parte dos defensores dos direitos das mulheres na Palestina e disse quepolíticos homens deixam de lado preocupações femininas muito constantemente. Esta atitude é embasada em argumentos de que existem problemas mais urgentes a serem resolvidos, como a ocupação por parte de Israel. Ainda segundo Ashrawi, Leis arcaicas que prejudicam as mulheres também atrapalham as aspirações palestinas[3].

A “Ministra dos Assuntos Femininos na Cisjordânia”, Rabiha Diab, afirmou que o aumento dos “Crimes de Honra” é muito claro na sociedade palestina, mas que nem sempre eles realmente ocorrem por algum motivo de proteção da imagem da família. Segundo Diab, em alguns casos os perpetradores alegam ter assassinado alguma mulher de sua família em nome da honra, quando na realidade o objetivo era se beneficiar financeiramente ou de alguma outra forma, sabendo das punições lenientes[4].

Em seu discurso, Ashrawi também condenou o uso do termo para se referir à violência doméstica contra as mulheres. Em sua opinião, a mulher não é um emblema de honra para o homem ou sua família, mas um membro igual da sociedade.

Os representantes de Mahmoud Abbas não se pronunciaram sobre o assunto.

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Imagem (Fonte):

http://www.timesofisrael.com/plo-official-israel-asked-us-out-of-negotiating-room/

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Fontes consultadas:

[1] Ver:

http://www.pchrgaza.org/portal/en/index.php?option=com_content&view=article&id=10138:increase-in-violence-against-women-two-girls-killed-in-jabalia-and-khan-younis-by-their-relatives&catid=36:pchrpressreleases&Itemid=194

[2] Ver:

http://www.haaretz.com/news/middle-east/1.576737

[3] Ver:

http://www.saudigazette.com.sa/index.cfm?method=home.regcon&contentid=20140228197105  

[4] Ver:

http://www.maannews.net/eng/ViewDetails.aspx?ID=677046

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Texto publicado originalmente no blog Oriente Médio Hoje.

Este e outros textos da autora podem ser conferidos em http://www.jornal.ceiri.com.br/author/carla/

PORQUE EU PREFIRO ESTAR ENTRE MUÇULMANOS ou “Meus dias com a Sarah”

Ok, isso não é inteiramente verdade. Eu não prefiro andar com muçulmanos mais do que qualquer outra pessoa, de qualquer outra religião ou cultura. Mas eu amo meus amigos muçulmanos e sou apaixonada pelas suas filosofias, ensinamentos e estilos de vida. Mas o título deste texto vem como uma resposta a qual as pessoas me perguntam bastante. E esta história teve início em Sarajevo, na Bósnia, em Junho de 2013. Ou talvez até antes.

Eu fui criada como judia. Filha de pais judeus, frequentei uma escola judaica, fui a sinagogas em festas e Shabatot, fui membro de um movimento juvenil judaico. Eu tive o judaísmo em minha vida como religião, como cultura, como história e até – se posso cruzar algum tipo de linha aqui – como um nacionalismo. E sou judia hoje, por opção. Eu amo o judaísmo.

No entanto, durante minha infância e adolescência, escutei muito sobre os problemas entre judeus e muçulmanos ao longo do tempo. Meus pais tiveram que deixar seu país natal porque Gamal Abdel Nasser forçou a saída de judeus do Egito. O mesmo aconteceu em outros países árabes. E hoje em dia temos o famoso conflito entre Israel e Palestina, que, claro, envolve muçulmanos e judeus. Porém – e não posso explicar como ou porque – nunca aceitei este “problema”, nunca pude entende-lo e jamais consegui fazer a conexão entre as pessoas envolvidas nestes embates com suas culturas e religiões.

Como disse, não sei porque. Talvez o motivo tenha sido as maravilhosas histórias que meu pai me contava de sua infância no Cairo, onde ele tinha amigos judeus, cristãos e muçulmanos. E eu sempre me perguntei o que exatamente tinha quebrado estas amizades. Teriam elas sido realmente quebradas?

Adicionalmente, minha curiosidade cresceu com meu amor inexplicável pela cultura árabe. Adorava escutar o árabe, a comida árabe, a arquitetura árabe, a música árabe, a dança árabe e o cinema árabe. Em certo ponto, comecei a frequentar uma sinagoga de judeus marroquinos, bem árabe.

Eu tinha que descobrir mais sobre tudo isso. Depois de ir a Israel cinco vezes – a primeira delas por um ano inteiro – e nunca tido a chance de conhecer um muçulmano em um país repleto de pessoas da religião, eu tentei encontrar minhas respostas em outro lugar. Fiquei sabendo da Conferência Judaico-Muçulmana em Israel mesmo, em 2011, onde conheci um dos seus fundadores. Em 2013 me inscrevi. Em Junho eu estava em Sarajevo, um lugar que jamais sonhei que poderia conhecer um dia.

Sarajevo em si, uma cidade muçulmana, é incrível. O lugar e as pessoas. A realidade estava acontecendo! Eu finalmente poderia conhecer muçulmanos e conversar com eles, discutir nossos “problemas”. Até entrei no Comitê de Resolução de Conflitos. Até que descobri que nós, na realidade, nunca tivemos problema algum. Não nós, que estávamos ali. Nós não tínhamos problemas. Tínhamos soluções. Levamos estas soluções conosco, em nossos longos voos até a Bósnia. Nós possuíamos objetivos comuns, culturas muito parecidas a uma enorme paixão por estar lá, juntos. Também descobri que eu estava ali para fazer amigos. E amigos a gente não escolhe pela religião, pela cor ou por nada. Amizade é uma coisa que acontece. Então lá pelo segundo dia, a pergunta “… e você é judeu ou muçulmano?” simplesmente foi parando de ser feita. Depois de um tempo, com alguns hábitos culturais, nós sabíamos, é claro. Expressões em árabe ou hebraico, histórias sobre Israel ou Meca, alguns costumes religiosos ou símbolo em uma bijuteria, nós sabíamos. E não éramos somente judeus e muçulmanos. Éramos também budistas, cristãos, ateus e mais.

Conheci muitas pessoas legais em Sarajevo. Foi a viagem da minha vida, adquiri esperança e a resposta que estava procurando. Não existe um problema real. E com pessoas daquele tipo, é possível resolver os problemas inventados.

Foi quando conheci a Sarah. Uma menina marroquina, doce, linda e divertida. Adorável. Ela é mais nova do que eu e ama muito seu país, não conseguia parar de falar coisas legais sobre ele. Me levou algum tempo para entender se a Sarah era muçulmana ou judia. Seu nome me sugeriu que ela tinha alguma ascendência judaica – como de fato ela tem. Ela nunca usou o hijab. Na sexta, ela decidiu não ir na mesquita nem na sinagoga (nas quais, aliás, grupos de muçulmanos e judeus foram juntos para celebrar o Shabat e a Jumah). Mas, de fato, ela era muçulmana. Com um sotaque em inglês cativante. A Sarah foi embora de Sarajevo na sexta à noite, dois dias antes de mim, o que quebrou meu coração. Ela insistiu que fossemos visita-la no Marrocos.

É uma incrível benção poder conhecer pessoas do mundo inteiro, de culturas e passados muito diferentes. Pode-se dizer que viajo bastante e, se você me perguntar, não importa qual o objetivo da viagem, conhecer pessoas é sempre a melhor parte e o maior aprendizado. Mas é ao mesmo tempo muito triste, porque uma vez que os cursos ou as conferências que frequento terminam, sei que as chances de reencontrar a maioria delas são muito pequenas. E isso me deixa muito, muito triste.

Eu voltei de Sarajevo e comecei a realizar meu sonho de estudar árabe. Conheci minha professora antes de saber que ela era filha de mãe judia é pai muçulmano. Ambos eram comunistas e se conheceram na União Soviética. Se casaram e foram morar na Síria. Eu também voltei para um dos meus hobbies favoritos, a dança do ventre. Confesso que amo muito mais pela música.

Cerca de cinco meses se passaram, a Sarah e eu continuamos nos falando por facebook e por whats app. Fui aceita em um curso para professores no Yad Vashem, em Jerusalém. E, meio que do nada, pensei que seria uma grande oportunidade para parar em Marrakesh, ver minha amiga e conhecer um lugar novo. Então mandei uma mensagem pra ela: “Querida, você falou sério sobre eu ir para Marrakesh?”. E ela respondeu: “Claro! Você ficará na minha casa, venha quando quiser”. Então eu fui. Simples assim.

Sobre esta viagem, tenho muitíssimas coisas para falar. Marrakesh é incrível. Tudo, as pessoas, as casas e os prédios, as palmeiras, o chá, o souk, o trânsito caótico e a beleza. A gentileza do povo. Eu realmente fiquei com a Sarah, na sua casa, com a sua família e passei meus dias no Marrocos com os amigos dela. Este foi o ponto alto da viagem. Estar com todos eles.

Não consigo descrever a recepção que me fizeram – algo que é muito comum e não foi exclusivo para mim. Me senti em casa depois de dez minutos lá. Chorei quando fui embora uma semana depois, porque eu ia sentir muitas saudades daquelas pessoas.

Eu rezei com meu sidur na casa da Sarah todos os dias. Guardei o Shabat lá. Eles me fizeram comida kasher. E eles rezaram também. Tão lindo, tão tocante vê-los rezar. O mesmo amor por uma força superior que eu vejo em preces na sinagoga. Eu visitei os lugares sagrados deles e eles me levaram aos meus. A Sarah veio comigo a uma sinagoga incrível, onde todos foram muito receptivos e ninguém nos perguntou de onde éramos ou porque estávamos ali. As pessoas lá não faziam a menor ideia de que nós duas éramos uma menina judia e uma muçulmana.

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Os dias passaram rápido demais, enquanto eu escutava ao árabe e à música e apreciava as vistas. Os amigos dela (espero poder chamá-los de meus amigos agora) são demais. Alguns deles bebem, outros não. Alguns deles fumam, outros não. Alguns deles me perguntaram sobre a minha religião e quiseram saber o motivo dos judeus odiarem os muçulmanos. Ao que eu respondi que não odiamos. Nós continuamos conversando sobre isso até rirmos e concordarmos que somos iguais. Provavelmente a conversa mais valiosa que já tive em minha vida durante meus 28 anos.

Durante estes dias, naturalmente e uma vez mais esquecendo que eu era uma judia no meio de muçulmanos, nós conversamos sobre tudo. Sobre a vida, a faculdade, carreiras, a vida no Brasil, a vida no Marrocos, o amor contido na Torah e no Corão. Descobrimos que temos muitíssimas coisas em comum. A principal delas é que entendemos nossas religiões como símbolos e mensagens de amor. E que sim, há pessoas que usam elas para arruinar a beleza da vida com palavras de ódio. Mas, acredite ou não, estas pessoas são a minoria entre nós. Elas só tem mais dinheiro para investir em propaganda.

Então, tentando responder à pergunta do título, eu amo – e não prefiro – estar entre muçulmanos porque isso faz eu me sentir como um ser humano, assim como eles. Isso me faz esquecer que exista um problema. Eu amo estar com muçulmanos porque eles têm uma cultura incrível, pela qual sou apaixonada. É mais fácil para mim estar entre muçulmanos, porque eles são curiosos sobre minha religião e minha cultura e, ao mesmo tempo, não julgam meu judaísmo. Meu judaísmo pessoal é meio difícil de explicar. Está em todo lugar em mim. Na minha fé, na minha história, no meu trabalho, nos meus costumes, nos livros que leio. Não é puramente religioso, nem puramente tradicional. É tudo. Algo que, acredite ou não, muitos judeus não conseguem entender. Sim, é muito fácil para mim ser judia entre meus amigos muçulmanos.

Tenho muito a agradecer à Sarah por fazer parte da minha vida e me proporcionar o que foi a melhor experiência (toda nova experiência acaba sendo a melhor da minha vida). Tenho que agradecer a ela por me ensinar sobre amor, por compartilhar comigo sua família e seus amigos. E por me colocar em contato com a parte mais linda do meu judaísmo. Devo agradece-la, ainda, por me aceitar do jeito que sou: uma mulher mais velha do que ela, branca, loira, brasileira, judia, historiadora, filha de egípcios, uma pessoa apaixonada por Israel (e, me deixe ser clara, pela Palestina também). Obrigada, Sarah.

Quando deixei o Marrocos fui para Jerusalém. Lá tive dias incríveis também com um grupo da América Latina, judeus e não judeus. Nós estudamos sobre o Holocausto, somos professores. Percebemos, juntos, que tudo o que vimos é só mais uma prova que o ser humano deveria se dar a oportunidade de conhecer uns aos outros melhor. Preconceito pode nos levar a atos extremamente horríveis. E esta também foi a melhor experiência da minha vida. Agora eu sinto tanta falta destas pessoas também, e estou bem triste em pensar que temos poucas chances de nos encontrar novamente. Que a vida permita cruzarmos nossos caminhos de novo.

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Em Israel eu passei o Shabat com judeus observantes e não observantes. Com pessoas que não são judias também. Cantamos, alguns de nós rezaram, todos pudemos nos conhecer melhor. Foi um sábado maravilhoso. Depois de tudo, encontrei com alguns dos meus amigos. Religiosos, não religiosos, ateus – todos judeus. E me senti bem demais com todos eles também. Como escrevi anteriormente, o título foi mais para chamar sua atenção. Mas foi também uma tentativa de responder a pessoas que pensam que de alguma forma eu fiquei maluca em algum ponto da minha vida e comecei a andar com muçulmanos. Eles me perguntam: “por que você prefere estar com muçulmanos do que com judeus?”. Então eu lhes digo. Eu prefiro estar com pessoas. Mas pessoas que podem trazer algo para minha vida e para as quais eu possa acrescentar algo também. E espero que isso possa significar todo mundo. Inclusive quem me faz esta pergunta. Eu sei que estas pessoas me trouxeram a oportunidade de escrever este texto – quem sabe alguém vá ler. E eu espero que estas pessoas leiam e abram suas mentes e seus corações para o fato de que todos somos o mesmo. Que “amarás o próximo como a ti mesmo” significa o que significa. Não há pensamentos escondidos por trás. A Bíblia não está dizendo que próximo devemos amar. E se eu tenho alguma faísca bem pequena de sabedoria acumulada em 28 anos, deve ser que nós só podemos amar depois de conhecermos o outro. E só podemos conhecer nos esforçando, conversando e nos aproximando, de corpo e alma.

Sobre os amigos do meu pai lá do Egito, que escrevi logo no começo. Ao longo da vida, com a internet, eles conseguiram se encontrar pelo mundo inteiro. Todos estão na casa dos 70 anos. E agora eles se encontram uma vez por ano. Todos eles. Muçulmanos, judeus, cristãos e de todas as religiões. Nunca houve um problema.

Eu tenho uma frase favorita na religião. É parte da Ética dos Pais e diz o seguinte: “Quem é o sábio? Aquele que aprende de todo homem”.

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Texto publicado originalmente no blog Oriente Médio Hoje.

Este e outros textos da autora podem ser conferidos em http://www.jornal.ceiri.com.br/author/carla/