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Dois anos sem Mubarak

Manifestantes gritando slogans e acenando bandeiras nacionais na Praça Tahrir, no Cairo.

No dia 11 de fevereiro de 2011, o então presidente do Egito Hosni Mubarak renunciou ao seu posto. Frente aos protestos ocorridos principalmente na Praça Tahrir, no Cairo, a queda de Mubarak foi um dos ápices da chamada Primavera Árabe.

A Primavera Árabe ganhou palco nos jornais e universidades do mundo inteiro por representar uma onda política revolucionária no Oriente Médio. Sendo de imensa particularidade em cada um dos países palcos deste evento já histórico, teve início em 2010 e ainda não chegou a um fim. Em alguns casos, nada mudou. Em outros, a luta continua.

Desde a renúncia do antigo presidente, o Egito passou por um governo militar provisório, teve suas primeiras eleições parlamentares democráticas e, enfim, em junho do ano passado, seu primeiro presidente eleito pelo povo. Uma eleição assistida por delegados da ONU, marcada por uma série de incertezas e, principalmente, por uma enorme divergência de opiniões políticas a respeito de qual deveria ser o novo partido a frente da República. Para conseguir uma real mudança em seu país, mais de um milhão de pessoas foram às ruas no Cairo. Só que este número não representa uma força significativa em uma região composta por mais de 80 milhões de habitantes.

Dois anos depois e os protestos continuam na Praça Tahrir e em frente ao Palácio Presidencial. O segundo aniversário da queda de Hosni Mubarak foi marcado por atos populares contra o governo de seu sucessor e atual presidente Mohammed Morsi. As Forças Armadas responderam espalhando gás lacrimogêneo dentre os militantes. O objetivo era dispersar algumas centenas de cidadãos que tentaram invadir o Palácio através da barreira de arame farpado que o protege. Algumas pessoas gritavam o desejo de derrubar o regime, enquanto outras atiravam pedras. Nas paredes encontram-se inscrições em grafite com uma palavra: “Erhal” (“Vá Embora”), o mesmo slogan utilizado nas manifestações de janeiro e fevereiro de 2011 direcionadas a Mubarak.

Nos últimos dias ocorreram diversas manifestações. Um homem mascarado bloqueou a passagem de trens na Estação Central do Cairo e uma dúzia de manifestantes parou o trânsito com pneus em chamas em um dos principais viadutos da cidade. Centenas de pessoas protestaram em frente ao escritório do promotor-chefe do Egito, demandando justiça pelos manifestantes mortos pelas Forças Armadas desde a subida de Morsi à presidência.

Mohammed Morsi representa a Irmandade Muçulmana, o grupo mais forte de oposição durante o governo Mubarak. No entanto, as queixas dos manifestantes nas ruas do Cairo e de Alexandria são de que pouco ou nada mudou nos últimos dois anos, acrescentando ainda um aumento na violência contra civis. As manifestações apresentam insatisfação em relação à estagnação econômica – resultante de uma rivalidade política entre o bloco Islamista conservador e sua significativa oposição secular – e à tentativa do atual presidente em monopolizar o poder, ignorando as demandas dos grupos liberais, principais participantes das manifestações. Muitos protestam também por uma emenda à nova constituição egípcia. O argumento é de que o partido islamista teria se apressado no processo de aprovação da nova Carta Constitucional apesar da falta de acordo com a oposição. Como resultado, criou-se uma carta que mina liberdades de expressão e de crença e desvaloriza os direitos das mulheres egípcias.

Morsi tem repetidamente negado as acusações, culpando a oposição e possíveis partidários de Mubarak de tentarem destruir o governo de um presidente eleito democraticamente. Após sete meses na presidência do Egito, a popularidade de Morsi caiu cerca de 50% de acordo com o pesquisador Magued Osman do Egyptian Center for Public Opinion Research. A pesquisa foi feita através de entrevistas pelo telefone e possui uma margem de erro inferior a 3%.

“Estamos aqui para que Mohammed Morsi, o ditador, saia. Ele é simplesmente tão ruim quanto Mubarak, senão pior”, disse Doaa Mustafa – dona de casa de 33 anos – em entrevista ao jornal israelense Haaretz, alegando estar disposta a permanecer protestando nas ruas até que Morsi renuncie, assim como Mubarak o fez.

Dois anos de manifestações, conquistas e derrotas e a luta por um Egito mais democrático continua. O termo histórico para “revolução” significa de forma geral uma grande mudança na ordem existente. O Egito democrático pelo qual os manifestantes têm lutado desde Janeiro de 2011 ainda não foi conseguido, mas certamente muito mudou. E o passo para se alcançar um objetivo é exatamente lutar pelo mesmo. Uma luta, mesmo que árdua, passível de ser assistida por parte de muitos cidadãos egípcios. Os meses passam, as estações mudam… a Primavera Árabe ainda tem muito pela frente.

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Texto publicado originalmente no blog Middle East Talks … vamos bater um papo sobre o Oriente Médio?

Este e outros textos da autora podem ser conferidos em http://orientemediohoje.com